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27.09.2024

Manifesto nacional sobre a notícia da tentativa da edição de portaria visando conter letalidade Policial versão final

As entidades de classe de âmbito nacional, subscritoras deste manifesto, vêm expor criticamente sua perplexidade com a notícia da possibilidade de edição de proposta do Ministério da Justiça e Segurança Pública, supostamente destinada a “disciplinar” o uso da força legal e da prerrogativa de executoriedade inerente ao poder de polícia em relação às Polícias Militares e Polícias Civis, condicionando o recebimento de repasses do Fundo Nacional de Segurança Pública à sua aplicação nos Estados.

 

Sendo verdadeira essa tentativa, tal iniciativa é impertinente e fora do contexto jurídico, pois ignora todo um conjunto de legislações consolidadas no ordenamento jurídico nacional e internacional (do qual o Brasil é signatário, como o Código dos Encarregados de Aplicação da Lei) a respeito da disciplina do uso da força pelos policiais de diferentes instituições, as quais mencionamos a título de esclarecimento:

 

– Lei n° 13.060/2014, de iniciativa do Senado Federal, que disciplina o uso dos instrumentos de menor potencial ofensivo pelos agentes de segurança pública, em todo o território nacional, lei sancionada pela Presidente Dilma Rousseff, em vigor, portanto, há 10 anos, e lamentavelmente desconsiderada pelo próprio Ministério, que não a utilizou como fundamentação, bem como usurpou competência do Presidente da República,  pois essa lei estabelece no seu art. 7º a competência do Poder Executivo (e não do Ministério da Justiça e Segurança Pública) para regulamentar, classificar e disciplinar a utilização dos instrumentos não letais, tal como assim se expressa em seu artigo 7°:

 

“Art. 7º O Poder Executivo editará regulamento classificando e disciplinando a utilização dos instrumentos não letais.”

 

– Lei nº 14.735/2023, que institui a Lei Orgânica Nacional das Polícias Civis, dispõe sobre suas normas gerais de funcionamento e dá outras providências., no seu art. 4°, V e X; Art. 5º, XIV);

 

– Lei nº 14.751/2023 (Lei Orgânica Nacional das Polícias Militares e Bombeiros Militares, no seu artigo 4°, VII, XIV e Art. 30):

 

– Lei nº 13.675/2018 – que Disciplina a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela segurança pública, nos termos do § 7º do art. 144 da Constituição Federal; cria a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS); institui o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), em seu artigo 4°, IX:

 

“Art. 4º {…}

 

IX – uso comedido e proporcional da força pelos agentes da segurança pública, pautado nos documentos internacionais de proteção aos direitos humanos de que o Brasil seja signatário;”      (Redação dada pela Lei nº 14.751, de 2023)”

 

– Inúmeros regulamentos das próprias instituições policiais que disciplinam o uso da força em diferentes métodos e doutrinas relativas ao uso progressivo, racional, escalonado e diferenciado de meios letais e de baixa letalidade.

 

– Portaria Interministerial 4.226/2010, expedida no segundo Governo Lula, que é a diretriz do governo federal que regulamenta o uso da força e de armas de fogo por agentes de segurança pública, atualmente em vigor.

 

?Assim, causa perplexidade, mais uma vez, a notícia da possibilidade da edição de ato normativo pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública de um tema importante e de impacto para a atividade policial, porém que sequer foi debatido no Conselho Nacional de Segurança Pública e Defesa Social – CONASPDS, integrado inclusive por ambas entidades de classe desde 2018.

 

Caso haja edição da portaria normativa idealizada pelo Ministério da Justiça e Segurança Pública, tal ato infralegal acabaria por criar contradições e possíveis antinomias a todo arcabouço normativo já consolidado, gerando mais insegurança jurídica e institucional, além de incompatibilidades com leis em sentido estrito – obviamente de acordo com a ciência jurídica mais basilar superiores em hierarquia a qualquer portaria, que, vale ressaltar, não poderia sob qualquer argumento dispor sobre matéria privativa de lei ordinária ou de regulamento do Chefe do Poder Executivo, principalmente quando a matéria já está regulada em lei federal e atos normativos do próprio governo.

 

Ao mesmo tempo, atribuir a letalidade somente aos órgãos policiais e seus integrantes, ignorando a malha de violência e a estrutura de atuação do crime organizado nacional e transnacional, é uma visão míope do sistema de segurança pública e dos fatores que geram a violência. Um policial que atua na linha de frente no enfrentamento à criminalidade violenta se sente, neste contexto, como se estivesse em uma caótica partida de futebol, em que o árbitro que tenta disciplinar a partida é rigoroso somente com uma das equipes, deixando a outra sem regulação e livre para fazer aquilo que desejar. No contexto da segurança pública do Brasil, com este tipo de iniciativa mal planejada, já se sabe qual será o resultado e quem sairá como ganhador perante a sociedade: a criminalidade e os delinquentes, infelizmente favorecidos por um sistema que favorece a impunidade.

 

Mais uma vez concitamos o Ministério da Justiça e Segurança Pública que, antes de divulgar ou apresentar ato regulatório, qualquer minuta, ou proposta regulamentar, tenha respeito e consideração ao consultar com antecedência as entidades nacionais representativas dos órgãos e dos cargos diretamente envolvido na temática da segurança pública e na disciplina da atividade policial sob qualquer eixo temático.

 

É o que esperamos, em prol da sociedade brasileira.

 

Brasília, 27 de setembro de 2024.

 

FENEME

Federação Nacional de Entidades de
Oficiais Militares Estaduais/DF

ADEPOL DO BRASIL
Associação dos Delegados de Polícia do Brasil

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